sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

S.O.S. pais




O Livro dos Pais
Paulo Oom
Ed. Matéria Prima
EAN 9789898461018


Sinopse

A aventura de criar um filho é maravilhosa mas também provoca muita ansiedade e preocupação. Saber o que fazer para ajudar os nossos filhos perante uma doença, um acidente ou uma birra pode ser difícil. Essa dificuldade faz com que os pais recorram aos profissionais de saúde, colocando as dúvidas que os inquietam. Aliando a sua vasta experiência como Pediatra à de pai de cinco filhos, dos 6 aos 20 anos, Paulo Oom decidiu reunir neste livro as perguntas que lhe são colocadas com mais frequência e que mais marcam o dia-a-dia dos pais e das mães.
Respondendo a questões que vão desde o primeiro mês do bebé até à adolescência, passando por temas como a alimentação, o desenvolvimento e as doenças mais comuns, o autor apresenta aqui um verdadeiro manual de instruções para lidar com o seu filho desde tenra idade.



Fui mãe pela primeira vez à pouco tempo... Na verdade fez, à cerca de 10 horas, 2 meses que me colocaram nos braços, pela primeira vez, um pequeno ser a quem se decidiu chamar Alexandre! Como acontece com muitas mães eu estava na altura, lamento dizê-lo, complectamente inconsciente do trabalho que acartava o dar vida a um ser. A maior parte dos pais, quando decide "aumentar a família", mentaliza-se para as fraldas borradas, as noites mal dormidas, as birras, as roupinhas que lhes acenam sedutoramente das montras das lojas, até mesmo dos enjoos e desejos gestacionais... Mas, por mais que mergulhem num sem número de livros da linha "what to expect when you are expecting", a verdade é que, a partir do momento que entram a porta de casa pela primeira vez com a sua carga preciosa nos braços começam, quase de imediato, a ser assaltados por dúvidas que nem sabiam que tinham. Quando, após a primeira birra, e depois de esgotar as possibilidades de fome-frio-calor-fralda_suja-mimo-cólica-prisão de ventre sem qualquer resultado, quase todos, em desespero de causa, desejam poder ter, a seu lado, para os guiar, a mão firme e experiente de um pediatra. E, após a vigésima chamada para o saúde 24, a maior parte sente, também, mais do que a própria incapacidade de poder e conhecimento parental, uma enorme vergonha por ter de depender de uma voz anónima para conseguir perceber o próprio filho. Este livro vem em auxílio a esses desesperados seres a quem se dá o nome de "Pais"!

Paulo Oom, pediatra de renome e, ele próprio, pai de 5 jovens com idades dos 6 aos 20 anos, coloca, assim, ao dispor de quem mais precisa a sabedoria que angariou ao longo dos anos enquanto profissional e progenitor. Neste volume podem os pais encontrar as respostas a questões tão díspares como "o que é a milia?", "como saber se está tudo bem com a sua criança vegetariana?", "deve ser feito algum exame antes de se iniciar um antibiótico?", "como se trata a dermatite das fraldas?", "existem as dores de crescimento?", ou mesmo "que tipo de óculos de sol se deve comprar?".

As questões e respostas fornecidas pelo médico visam exclarecer as dúvidas que possamos ter sobre vários temas (crescimento, desenvolvimento, alimentação, doenças mais frequentes, vírus e bactérias, medicamentos, acidentes e sua prevenção, disciplina e tempos livres e, finalmente, campo, sol e praia) numa linguagem acessível a todos os leigos da medicina. Como o prórpio autor nos diz, na sua introdução "Utilizei uma linguagem simples, sem termos médicos complicados, e procurei transmitir os aspectos mais práticos da arte de ser pai ou mãe. Espero que vos ajude em momentos de dúvida a compreender e lidar melhor com os vossos filhos. E, principalmente, que torne a aventura da educação de uma criança, ainda mais entusiasmante:"

Eu, leitora compulsiva, me confesso... é este, de momento, o meu livro de cabeceira!


 
Nota 4

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Em terra de cegos...



Ensaio sobre a cegueira
José Saramago
Editoral Caminho
ISBN 9789722110211



Sinopse

Uma cidade é devastada por uma epidemia instantânea de "cegueira branca". Face a este surto misterioso, os primeiros indivíduos a serem infectados são colocados pelas autoridades governamentais em quarentena, num hospital abandonado. Cada dia que passa aparecem mais pacientes, e esta recém-criada "sociedade de cegos" entra em colapso. Tudo piora quando um grupo de criminosos, mais poderoso fisicamente, se sobrepõe aos fracos, racionando-lhes a comida e cometendo actos horríveis. Há, porém, uma testemunha ocular a este pesadelo: uma mulher, cuja visão não foi afectada por esta praga, que acompanha o seu marido cego para o asilo. Ali, mantendo o seu segredo, ela guia sete desconhecidos que se tornam, na sua essência, numa família. Ela leva-os para fora da quarentena em direcção às ruas deprimentes da cidade, que viram todos os vestígios de uma civilização entrar em colapso. A viagem destes é plena de perigos, mas a mulher guia-os numa luta contra os piores desejos e fraquezas da raça humana, abrindo-lhes a porta para um novo mundo de esperança, onde a sua sobrevivência e redenção final reflectem a tenacidade do espírito humano.



O Homem vive restringido pelas regras que a sociedade lhe impõe. O seu desejo de aceitação e de pertença é tal que, frequentemente, adopta uma personagem pública, em contraste com a pessoa que realmente é, de forma a ser aceite. Essa hipocrisia social é aceite e, até, incentivada, como uma das formas de sobrevivência a que a Humanidade teve de se submeter ao longo dos séculos. Somos quem somos, mas somos julgados por quem aparentamos ser... Mas, e se tivéssemos a liberdade de nos saber invisíveis a quem nos rodeia? Continuariamos a viver no nosso mundo do faz de conta ou acabaríamos por nos render à bestialidade do que somos? Saramago responde a estas perguntas neste magnífico livro. Sem a pressão de se sentir sob um microscópio social, rapidamente a sociedade esqueceria as regras pelas quais se regia e daria lugar aos instintos primitivos que, na realidade, a habitam. Sem o saberem, todos são observados por uma testemunha... Uma mulher que, escapando à epidemia que cegara todo o Mundo, observa aterrorizada enquanto a realidade em que vivera dá lugar a um novo mundo... imundo, imoral e bárbaro. É através dos seus olhos que nos vemos, como realmente somos.


"Este livro é francamente terrível, com o qual eu quero que o leitor sofra tanto como eu sofri ao escrevê-lo. Nele se descreve uma longa tortura. É um livro brutal e violento e é, simultaneamente, uma das experiências mais dolorosas da minha vida. São 300 páginas de constante aflição. Através da escrita, tentei dizer que não somos bons e que é preciso que tenhamos coragem para reconhecer isso."

José Saramago

terça-feira, 31 de agosto de 2010




O Trinufo dos Porcos
George Orwell
Publicações Europa-América
EAN: 9789721040984



Sinopse:

Livro recomendado no programa de Português do 9º ano de escolaridade, destinado a leitura orientada na sala de aula - Grau de Dificuldade II.

Publicado pela primeira vez em 1945, "O Triunfo dos Porcos" transformou-se na clássica fábula política deste século. Acrescentando-lhe a sua marca pessoal de mordacidade e perspicácia, George Orwell relata a história de uma revolução entre os animais de uma quinta e o modo como o idealismo foi traído pelo poder, pela corrupção e pela mentira.




Publicada pela primeira vez em 1945, esta obra saída da pena do autor de "1984", é, também ela, carregada de uma forte crítica política e social. Inspirada na Revolução Comunista Russa, Orwell consegue, ao colocar o âmago da acção na mão dos animais (principalmente dos Porcos mencionados no título desta tradução) chocar os leitores com a bestialidade do ser humano. E, ao lermos as suas palavras, não conseguimos evitar debatermo-nos com um dilema moral: se tais acções nos chocam nos animais, porque motivo as aceitamos ao Homem?

Em relação às edições disponíveis em Portugal, apesar das críticas às publicações da editora Europa-América, depois de me debruçar sobre a edição desta e a de uma outra editora (que manteve o mais correcto nome, em relação ao original, "A Quinta dos Animais"), acabei por adquirir esta. Isto porque, enquanto estudante de Línguas e Literaturas (especialização de Tradução) encontrei na outra, logo nas primeiras páginas, um grave erro de tradução:  o tradutor decidiu traduzir os nomes de todas as personagens, tornando-as "mais portuguesas".  Ora, como qualquer aluno iniciado nas artes de traduzir lhes poderá dizer, uma das regras elementares da tradução é "NUNCA se traduzem nomes próprios!".  Daí aconselhar a edição da Europa-América!

quinta-feira, 8 de julho de 2010

Bebé a Bordo

Pois é... Sei que tenho andado distante e tenho-me desleixado bastante com a periocidade deste blog mas a verdade é que tenho uma excelente desculpa... Descobri, à 3 meses, que estou à espera do meu primeiro filho (ou filha) e a excitação desta primeira viagem afastou-me, até, das minhas leituras. Agora, aos 4 meses e 1 semana, e depois da primeira ecografia, achei melhor partilhar e explicar o porquê do afastamento. Prometo que vou tentar melhorar!!!

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Negócio de Família





A Loja dos Suicídios
Jean Teulé
Editora Guerra & Paz
EAN 9789898014900



Sinopse:

É uma lojinha onde nunca entra um raio de Sol. Imagine um negócio de famíliaque envolve a venda de todos os ingredientes possíveis para a prática do suicídio, nas suas mais diversas formas. Corda, pistola, facas, venenos e toda uma panóplia de produtos mortíferos. São cinco as personagens que compõem esta família atípica que gere a loja à várias gerações: os pais, profissionais, comerciantes; o filho primogénito, deprimido crónico mas extremamente criativo no seu domínio; a irmã, exemplo típico da adolescente inadaptada; e finalmente o irmão mais novo, o verdadeiro grão de areia na engrenagem deste comércio lúgubre: é que ele se atreve a sorrir e a ser... optimista. Com uma ambiência digna de um filme de Tim Burton, A Loja dos Suicídios é uma comédia negra futurista que invoca o grande adversário da família Tuvache e do seu sinistro empreendimento: a alegria.


Lucrécia e Mishima são, como tantos outros, pais cheios de expectativas no que diz respeito à sua prole. As suas expectativas é que não são assim tão comuns. Donos da Loja dos Suicídios este casal alimenta a insegurança, depressão e morbidez de cada um dos seus filhos. Bem sucedidos com Vincent, o filho mais velho, anoréctico, depressivo, desenquadrado e propenso a enxaquecas, e com Marilyn, a filha do meio, típica adolescente desajustada, insegura e ressentida... Mas a história é outra quando falamos de Alan, o filho mais novo da família Tuvache... uma verdadeira "ovelha branca"! Desde bebé que Alan se revelou um problema, pois numa família que se orgulha da sua depressão e seriedade, o jovem recebia os clientes com sorrisos e palrava alegremente. Com o passar do tempo, e apesar das inúmeras tentativas por parte dos pais e irmãos para lhe incutir os princípios do negócio, Alan teimava a continuar a receber alegremente os clientes e a despedir-se com um "volte sempre" que ia totalmente contra as regras da casa (que se orgulhava tanto da eficácia dos seus produtos que adoptara como moto "A sua vida foi um fracasso? Connosco, a sua morte será um sucesso!"). Lucrécia e Mishima, desesperados pela alegria e esperança que Alan traz, tentam vergá-lo a todo o custo mas... será a felicidade contagiante?

O livro é pequeno (160 páginas) e dificilmente se poderá considerar um clássico... Mas é um livro que se lê facilmente e que, para quem, como eu, gosta de humor negro, colocará um sorriso nos lábios do leitor e até, talvez, lhe consiga arrancar uma ou outra gargalhada. E, com uma ironia que nos relembra que na vida às vezes as coisas não correm como planeado, o final irá surpreendê-lo.

 

Nota 3

terça-feira, 11 de maio de 2010



Obrigada à feira do livro de Lisboa. Fui lá passear com o meu pai e trouxe algumas pechinchas. Principalmente Poesia. Uma das aquisições foi o livro "Outro Tempo", de W. H. Auden (ISBN 972-708-728-0), que contém este poema que eu ADORO!!!! E, apenas, por 5€.



Funeral Blues

"Stop all the clocks, cut off the telephone,
Prevent the dog from barking with a juicy bone,
Silence the pianos and with muffled drum
Bring out the coffin, let the mourners come.

Let aeroplanes circle moaning overhead
Scribbling on the sky the message He Is Dead
Put crepe bows round the white necks of the public doves,
Let the traffic policemen wear black cotton gloves.

He was my North, my South, my East and West,
My working week and my Sunday rest,
My noon, my midnight, my talk, my song,
I thought that love would last forever: I was wrong.

The stars are not wanted now: put out every one;
Pack up the moon and dismantle the sun;
Pour away the ocean and sweep up the wood.
For nothing now can ever come to any good."

W. H. Auden
Nota 4

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Agatha Christie




A diabólica casa isolada/Os treze problemas
Agatha Christie
Edição Livros do Brasil
Colecção Vampiro Gigante


Sinopses

A Diabólica Casa Isolada:
Nick não é um nome vulgar numa mulher. Mas Nick Buckley não é uma jovem vulgar. Mais invulgar ainda é a quantidade de "acidentes" de que tem sido vítima: numa traiçoeira encosta da Cornualha, os travões do seu carro falham; mais tarde, num caminho costeiro, serão apenas alguns uns centímetros que a separarão de uma derrocada; por fim, escapa por pouco quando um pesadíssimo quadro cai e quase a esmaga durante o sono. Serão estes "acidentes" meras coincidências?
Após ter descoberto um buraco de bala no chapéu de Nick, Hercule Poirot decide que a jovem precisa da sua protecção. E começa a deslindar o mistério de um assassinato que não foi cometido. Ainda...

Os Treze Problemas:
Numa terça-feira à noite, um grupo de amigos junta-se em casa de Miss Marple e a conversa decorre em torno de crimes por resolver. Cada um dos participantes está convencido de que é melhor conhecedor da natureza humana que os restantes, o que dá o mote à criação do Clube das Terças-feiras, ocasião para que cada um deles apresente um caso do qual apenas o próprio sabe a solução. Caberá a todos os outros convivas provar até que ponto são bons observadores e ouvintes e tentar deslindar os sucessivos mistérios.
As noites de St. Mary Mead passam, pois, a ser dedicadas ao crime...
Os Treze Enigmas (The Thirteen Problems) foi publicado na Grã-Bretanha em 1932; no mesmo ano apareceu nos Estados Unidos sob o título The Tuesday Club Murders.



Neste livro, os dois pesos pesados da literatura policial que são Hercule Poirot e Miss Marple, apresentam-se para deleite dos leitores.

A primeira história traz-nos o detective belga, na companhia dos seus fiéis companheiros Capitão Hastings e Inspector Chefe Jaff. Poirot e Hastings encontram-se de férias num hotel na Cornualha quando conhecem uma jovem a quem chamam Nick. Esta conta-lhes alguns acidentes bizarros que lhe têm acontecido nos últimos tempos e que, por pouco, não lhe roubam a vida. Durante a conversa a jovem sente uma vespa passar-lhe junto à cabeça e, com um gesto despreocupado, tenta enxotá-la. Ao ir-se embora deixa para trás o seu chapéu... Nessa altura, Hercule Poirot percebe que a jovem corre mesmo perigo, ao constatar que a vespa era, afinal, uma bala que deixou um buraco no chapéu e que, por pouco, não ceifou a vida a Nick. O detective decide, assim, tomar a seu cargo a protecção da jovem... Ainda que os seus amigos tudo pareçam fazer para o impedir a ter sucesso. Mas... Será tudo aquilo que parece ser???

O segundo livro deste volume, é formado por treze contos com Miss Marple como figura principal. A saber: O "Clube Nocturno de Terça-Feira", O Ídolo de Astarte, Lingotes de Ouro, O Pavimento Ensaguentado, Motivo e Oportunidade, A Marca do Polegar de São Pedro, O Gerânio Azul, A Companheira, Os Quatro Suspeitos, Uma Tragédia de Natal, A Erva da Morte, O Caso do Bangaló, Morte Por Afogamento. Este livro divide-se em 3 partes. Os seis primeiros contos têm lugar na casa da idosa residente de St. Mary Mead quando, num serão acompanhada pelo sobrinho escritor Raymond, pela artista plástica Joyce, por Sir Henry Clithering (reformado da Scotland Yard), o clérigo Dr. Pender e pelo advogado Mr. Petherick, decidem fazer um jogo no qual cada membro apresentará um mistério do qual só o próprio sabe a solução para que os restantes membros o tentem resolver. Ainda que, de princípio, os membros mais jovens do Clube não contem com Miss Marple para o mesmo, a verdade é que esta é a única a conseguir resolver todos os enigmas. Os seis contos seguintes têm lugar num jantar em que Sir henry Clithering, tendo sido convidado, lança o nome da idosa para os convivas e decidem reviver o espírito do Clube das terças-feiras. O último conto é uma história isolada na qual Miss Marple e Sir Henry voltam a unir esforços. Em todos os contos uma coisa se torna óbvia: Miss Marple tem razão quando diz que, ao se viver numa pacata aldeia inglesa, se consegue ter um perfeito conhecimento da natureza humana... Ela prova-o, ao decifrar Os Treze Problemas.

segunda-feira, 12 de abril de 2010







Escritores à Mesa e Outros Artistas
José Quitério
Assírio & Alvim
ISBN: 9789723714654


Sinopse

Os textos que compõem este livro têm proveniências diferentes: 6 figuram no Livro de Bem Comer, 14 em Histórias e Curiosidades Gastronómicas, 11 são inéditos. Os não inéditos foram objecto de revisão, emendas e acrescentos (nalguns casos substanciais). Escritores à Mesa (e outros artistas) resulta da necessidade de rearrumação, tendo em vista que os dois livros anteriormente referidos jamais serão reeditados como tais. Surgirão refundidos, aparados, apurados e aumentados num único volume, sob o título Bem Comer & Curiosidades, no fim do presente ano. A presente obra pretende ser uma homenagem sobretudo aos escritores que nem por serem dos maiores deixaram de tratar dum tema que muitos letrados enfadados (e enfadonhos) consideram matéria menor ou mesmo abominável. Que possa servir também de antepasto para uma há muito prometida Antologia da Gastronomia na Literatura Portuguesa (séculos XIII-XX), a vir ao mundo, se o permitirem o tempo e as potestades, em 2011.


Foi com grandes expectativas que me debrucei sobre este livro. Portugal, para mim, está sempre associado a "boa mesa". Mesmo em momentos de dificuldades consegue-se sempre fazer um repasto que não envergonhe ninguém. Sendo descendente de alentejanos, essa era uma realidade desde sempre implantada na minha mente... Mesmo sem grandes luxos, havendo pão, azeite e meia dúzia de ingredientes surgia na mesa uma açorda, um ensopado ou, nos meses quentes de Verão, o belo gaspacho. A imaginação tornava-se superior à privação. E, se fossem disponibilizados meios sem restrições, surgia à refeição um verdadeiro banquete... Peixe, carne, enchidos, queijos, tudo ganhava papel de destaque na hora da partilha. E, nos livros de autores lusófonos, a mesa era isso mesmo; um lugar de partilha em que, a simples leitura da descrição do que nela se dispunha, abria o apetite e alagava a boca do leitor.

Gostei do livro, mas... Se calhar as minhas expectativas eram demasiado elevadas, mas fiquei com um sentimento de vazio... como se visse defraudada uma promessa de grandeza que não se elevara a toda a sua potencialidade.

O autor descreve não só as referências literárias "à mesa", como também tenta, sempre que possível, explicar o contexto em que estas se inserem. Ou seja, chega ao ponto de localizar geograficamente restaurantes e hoteís, partilhar preçários, etc etc etc. Ainda assim, e por muito prazer que tenha tido na leitura do livro, não me "satisfez"...


Nota 3

segunda-feira, 5 de abril de 2010

Revolutionary Road




Revolutionary Road
Richard Yates
Biblioteca Sábado
EAN 5602831080654


Sinopse

O primeiro romance de Richard Yates, Revolutionary Road, tornou-se um clássico logo após a sua publicação em 1961. Nele, Yates oferece um retrato definitivo das promessas por cumprir e do desabar do sonho americano. Continua hoje a ser o retrato da sociedade americana.
Um casal jovem e promissor, Frank e April Wheeler, vive com os dois filhos num subúrbio próspero de Connecticut, em meados dos anos 50. Porém, a aparência de bem-estar esconde uma frustração terrível resultante da incapacidade de se sentirem felizes e realizados tanto no seu relacionamento como nas respectivas carreiras. Frank está preso num emprego de escritório bem pago mas entediante e April é uma dona de casa frustrada por não ter conseguido seguir uma promissora carreira de actriz. Determinados a identificarem-se como superiores à crescente população suburbana que os rodeia. decidem ir para a França onde estarão mais aptos a desenvolver as suas capacidades artísticas, livres das exigências consumistas da vida numa América capitalista. Contudo, o seu relacionamento deteriora-se num ciclo interminável de brigas, ciúmes e recriminações. o que irá colocar em risco a viagem e os sonhos de auto- -realização.


Tal como aconteceu com o Quem Quer Ser Milionário, também com este livro surgiu na minha lista de futuras leituras após ter visto o filme. Mas, se no caso do primeiro, foi o seu lado de entretenimento e de possibilidades infidáveis que me atraiu, neste foi a inevitabilidade da vida humana com todos os seus dramas por trás de portas fechadas. Este NÃO é o livro a ler se se quiser afastar dos negrumes do dia-a-dia... Pelo contrário. No entanto, e tendo já uma pilha de livros "a ler", a ganhar pó nas várias prateleiras espalhadas pela casa, não via necessidade em comprar imediatamente um livro do qual já conhecia a história. Os seus (quase) 17€ podiam ser aproveitados em viagens literárias aventureiras das quais ainda não conhecia o percurso. Mas foi então, quase como que em resposta a uma prece que nunca chegara a fazer, que a revista Sábado decidiu prendar os seus leitores com mais uma colecção de magníficas obras a 1€ cada. Revolutionary Road era uma delas!!! (já agora, e em forma de nota e em resposta a todos os que já me perguntaram, desconfiados, da qualidade da tradução dos livros que saem com a revista, dou como exemplo este, cuja tradução de Isabel Baptista foi cedida pela editora Civilização, a editora a comercializar o livro em Portugal - EAN/ISBN 9789722626361).

Quanto ao livro propriamente dito... Excedeu as minhas expectativas!!! A maneira como Richard Yates elaborou esta brilhante obra de arte literária é de uma mestria e excelência recomendáveis. A história, que aborda as insatisfações e frustrações profissionais e pessoais de um jovem casal a viver o suposto "american dream", está escrita de uma maneira que sentimos, tal como eles, que os dias são rotineiros e custam a passar... Não quero com isto dizer que o livro esteja escrito de uma forma "secante". Muito pelo contrário. Acredito ser este um dos exemplos do génio literário de Yates. Uma demonstração de como, ainda que dizendo-se muito, consegue-se passar uma sensação de quase estagnação. No entanto, a partir do momento em que Frank e April decidem perseguir o seu sonho e viajar para Paris, numa fuga à "vida quotidiana" e numa perseguição final dos sonhos há muito esquecidos, os momentos parecemn encadear-se uns nos outros com uma rapidez que, só os que já se entregaram aos sonhos, conseguem reconhecer. Existe uma sofreguidão, um desejo de romper as barreiras e algemas sociais que nos impomos a nós próprios, que o tempo parece compactuar com essa nossa urgência, apressando os ponteiros do relógio. É então que a "vida real" e o senso comum chegam e põem um pé no travão das ideologias. Os "mas", "e se", "será que...", multiplicam-se na nossa mente até congelarem os movimentos e aterrorizarem a esperança... E acabamos por nos conformar à existência neutra e segura que abominamos, que nos aprisiona mas nunca falha. Adorei!!!


Nota 4

quinta-feira, 1 de abril de 2010



Florbela Espanca

Florbela é, possivelmente, a minha poetisa favorita. Talvez seja a minha costela alentejana a falar, mas a verdade é que considero os seus poemas belíssimos... A simplicidade e honestidade que colocou no papel iluminaram todas as palavras que nos deixou. Não tinha pretensões, não tentava elevar-se intelectualmente por palavras caras ou sentimentos insinceros... Simplesmente, ERA, SENTIA, DIZIA. E na Poesia, uma arte tantas vezes considerada elitista, Florbela tem o condão de se ligar a toda e qualquer pessoa.

Poetisa portuguesa, natural de Vila Viçosa (Alentejo). Nasceu filha ilegítima de João Maria Espanca e de Antónia da Conceição Lobo, criada de servir (como se dizia na época), que morreu com apenas 36 anos, «de uma doença que ninguém entendeu», mas que veio designada na certidão de óbito como nevrose. Registada como filha de pai incógnito, foi todavia educada pelo pai e pela madrasta, Mariana Espanca, em Vila Viçosa, tal como seu irmão de sangue, Apeles Espanca, nascido em 1897 e registado da mesma maneira. Note-se como curiosidade que o pai, que sempre a acompanhou, só 19 anos após a morte da poetisa, por altura da inauguração do seu busto, em Évora, e por insistência de um grupo de florbelianos, a perfilhou. Estudou no liceu de Évora, mas só depois do seu casamento (1913) com Alberto Moutinho concluiu, em 1917, a secção de Letras do Curso dos Liceus. Em Outubro desse mesmo ano matriculou-se na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, que passou a frequentar. Na capital, contactou com outros poetas da época e com o grupo de mulheres escritoras que então procurava impor-se. Colaborou em jornais e revistas, entre os quais o Portugal Feminino. Em 1919, quando frequentava o terceiro ano de Direito, publicou a sua primeira obra poética, Livro de Mágoas. Em 1921, divorciou-se de Alberto Moutinho, de quem vivia separada havia alguns anos, e voltou a casar, no Porto, com o oficial de artilharia António Guimarães. Nesse ano também o seu pai se divorciou, para casar, no ano seguinte, com Henriqueta Almeida. Em 1923, publicou o Livro de Sóror Saudade. Em 1925, Florbela casou-se, pela terceira vez, com o médico Mário Laje, em Matosinhos. Os casamentos falhados, assim como as desilusões amorosas, em geral, e a morte do irmão, Apeles Espanca (a quem Florbela estava ligada por fortes laços afectivos), num acidente com o avião que tripulava sobre o rio Tejo, em 1927, marcaram profundamente a sua vida e obra. Em Dezembro de 1930, agravados os problemas de saúde, sobretudo de ordem psicológica, Florbela morreu em Matosinhos, tendo sido apresentada como causa da morte, oficialmente, um «edema pulmonar». Postumamente foram publicadas as obras Charneca em Flor (1930), Cartas de Florbela Espanca, por Guido Battelli (1930), Juvenília (1930), As Marcas do Destino (1931, contos), Cartas de Florbela Espanca, por Azinhal Botelho e José Emídio Amaro (1949) e Diário do Último Ano Seguido De Um Poema Sem Título, com prefácio de Natália Correia (1981). O livro de contos Dominó Preto ou Dominó Negro, várias vezes anunciado (1931, 1967), seria publicado em 1982.

in http://www.astormentas.com/




Velhinha

Se os que me viram já cheia de graça
Olharem bem de frente em mim,
Talvez, cheios de dor, digam assim:
“Já ela é velha! Como o tempo passa! ...”

Não sei rir e cantar por mais que faça!
Ó minhas mãos talhadas em marfim,
Deixem esse fio de oiro que esvoaça!
Deixem correr a vida até o fim!

Tenho vinte e três anos! Sou velhinha!
Tenho cabelos brancos e sou crente ...
Já murmuro orações ... falo sozinha ...

E o bando cor-de-rosa dos carinhos
Que tu me fazes, olho-os indulgente,
Como se fosse um bando de netinhos ...

Florbela Espanca, in "Livro de Mágoas"

sábado, 27 de março de 2010




A Arte de Ser Pai
Cartas de Eça de Queiroz para os seus filhos
Eça de Queiroz
Verbo
EAN 9789722229807



Sinopse

Ao entrar em contacto pela primeira vez com as cartas de Eça de Queiroz aos filhos, a sua leitura acordou em mim reminiscências de infância e consegui interiormente recuperar ecos quase esquecidos de versos de Vítor Hugo aos netos, fragmentos soltos dos poemas que compõem L’art d’être grand-père. Isso explica o título desta colectânea de cartas. É preciso não esquecer que Eça de Queiroz foi pai pela primeira vez aos 41 anos completos e que Ramalho, por exemplo, mais velho que o amigo, se sentia mais avô do que tio dessas crianças.



Adoro o Eça. A maior parte das pessoas com quem falo sobre este meu gosto literário encolhem-se face a esta confissão... Mais ainda quando sabem que já li os Maias umas quatro ou cinco vezes e que a primeira vez que o fiz foi na praia, muito antes de ter de ler o livro para a escola. Mas as pessoas que se encolhem, que franzem o nariz aos livros de Eça são, muitas das vezes, as mesmas que nunca abriram um e o leram "de fio a pavio".

Apesar de me aventurar nas obras do mestre, o meu conhecimento biográfico de Eça era, devo admiti-lo, bastante limitado. Conhecia o seu percurso profissional (literário e diplomata) e possuo a, enorme, obra "Eça de Queiroz - Emília de Castro, correspondência epistolar" (Lello & Irmãos, EAN 9789724816869, ISBN 972-48-1686-9), mas não tinha qualquer ideia dele enquanto pai... Quero dizer, ele fala dos filhos nas cartas à mulher, mas uma coisa é falar de crianças com um adulto, outra, complectamente diferente, é dirigir-se a essa mesma criança. Neste caso, crianças, os quatro filhos do casal: Maria (a mais velha e, por isso, a que mais conviveu com o pai e por quem, podemos vê-lo no livro, Eça tinha uma preferência), José Maria, António e Alberto.

O Eça deste livro é, para mim, um novo Eça. Vemos um lado mais emotivo, sensível, "despido", de um homem que marcou a literatura com o seu tom ácido, irónico e com o seu humor contundente. A inteligência, que também marca a sua obra, é aqui visível pela maneira como consegue colocar-se ao nível dos filhos sem se estupidificar, edificando as crianças e ajudando, desta forma, a moldar-lhes o carácter e a personalidade. Sem se tornar óbvio, nunca deixa de puxar pelos filhos e de lhes exigir mais e melhor (quer da escrita quer do comportamento), e mostra-se um pai orgulhoso das pequenas façanhas e das metas atingidas pelas crianças, partilhando-as com os amigos mais próximos.

O livro, de pouco mais que 140 páginas, tem representadas as cartas originais de Eça, em francês, seguidas das traduções... No entanto, se tiver que fazer uma crítica, acho uma pena que o mesmo não tenha sido feito às cartas que o escritor recebeu dos filhos. Ao manter apenas a versão original, na língua de Voltaire, pode comprometer a compreensão das mesmas a alguns leitores.



Nota 3

quarta-feira, 24 de março de 2010

Seriedade literária de um cómico de profissão





O Xangô de Baker Street
de Jô Soares
Editorial Presença
EAN 9789722320313
ISBN 972-23-2031-9



Sinopse

Estamos em 1886, o ano da primeira e triunfal tornée de Sarah Bernhardt no Brasil. Na corte de D.Pedro II, passa-se um facto estranho: desaparece o Stradivarius - o último fabricado - que este havia oferecido à baronesa de Avaré. Ao mesmo tempo alguém começa a assassinar jovens mulheres, decepando-lhes sistematicamente as orelhas e deixando nos corpos uma corda de violino. Sarah Bernhardt propõe ao imperador convidar o famoso Sherlock Holmes - e o seu inseparável doutor Watson - para resolver o caso. Misturando sabiamente realidade e ficção, Jô Soares fez deste enredo o ponto de partida de um extraordinário e inspirado romance que ressuscita com rigor histórico os coloridos e contrastantes ambientes do Rio oitocentista. Jô Soares revela assim uma nova e notável faceta do seu talento. Ele encanta-nos e diverte-nos com a sua genial (e maliciosa) recriação de um Sherlock que até fala um perfeito português lisboeta, da "divina" Bernhardt, assim como outras figuras conhecidas da história política e cultural do país. Com o humor inteligente que o caracteriza, Jô Soares escalpeliza os costumes da época e avança a ousada suposição de o Brasil ter sido o berço do primeiro serial killer da História. O resto, só mesmo saboreando a leitura deste livro invulgar, que se lê da primeira à última página sem parar.


Na altura em que este livro saiu, à mais de 10 anos, chamou-me logo a atenção! Talvez porque tudo o que relacionava, então, com a imagem do autor era um homem de dimensões alargadas, a levar a mão à boca e, distribuindo beijos invisíveis, proclamar "Um beijo do Gordo". Não era, propriamente, a ideia que fazia de um autor de policiais! Comprei-o, céptica, e devorei-o entre empolgação e gargalhadas.

Todos já ouviram, pelo menos uma vez na vida, mencionar o nome de "Jack, o Estripador". O serial-killer inglês que assombrou a Inglaterra victoriana, assassinando durante o ano de 1888 prostitutas num dos bairros mais empobrecidos da capital britânica, Whitechapel e que, nunca tendo sido descoberto, ficou conhecido para a história pelo pseudónimo macabro. Eu, que adoro uma boa história de mistério, não só já conhecia o seu nome, como seguia, quase avidamente, as novas teorias que iam surgindo. Qual não foi a minha surpresa quando, ao chegar ao final do livro, descobri que Jack era, na verdade... brasileiro! É assim, o livro de Jô Soares... Absurdo, confuso, divertido e, mais do que qualquer outra coisa... Surpreendente.

Misturando figuras reais da história, como D. Pedro II do Brasil, a música e compositora Chiquinha Gonzaga e a actriz Sarah Bernhardt, com figuras fictícias, mas bem conhecidas de todos, como Sherlock Holmes e o seu parceiro Dr. Watson, Jô Soares leva-nos numa viagem pelas ruas do Brasil dos finais do século XIX, enquanto vamos tentando acompanhá-lo na descoberta de um assassino em série que espalha o terror na aparente calma do povo brasileiro.

Claro que, num livro proveniente da mente de um dos mais famosos cómicos brasileiros, não poderia falar o humor. Neste caso, o mesmo é-nos servido pela rídicula caracterização de Sherlock que, para além de ser um miúpe em negação, chega às suas famosas deduções por sorte ou através do talento dos que o rodeiam.

Este livro NÃO é um clássico... NÃO é o livro para marcar uma vida. Mas, no Verão pelo qual já se anseia, pode ser um excelente companheiro para um daqueles dias de praia solarenga de que todos parecem ter saudades!

Nota 4

sábado, 20 de março de 2010

Perguntas Inteligentes

- Boa tarde! Pode ajudar-me?
- Boa tarde! Claro, o que procura?
- Olhe, estou à procura de 2 livros que vi na vossa loja do Vasco da Gama. Não me lembro dos títulos, mas custavam 19,90€ e estavam numas prateleiras.

sexta-feira, 19 de março de 2010

Memória curta ou Amnésia selectiva?




Captive Passage
The Transatlantic Slave Trade
and the Making of the Americas
Vários Autores
Smithsonian Institution Press
ISBN 1-58834-017-1
EAN 9781588340177


Sinopse:

Publicado em conjunto com a abertura de uma exposição itinerante no Mariner's Museum em Newport News, Virgínia, estes oito ensaios e 160 ilustrações coloridas examinam as causas complexas, os resultados e os legados do 400 anos de comércio de escravos. Entre onze e treze milhões de africanos foram transportados à força através do Atlântico em navios, fazendo desta "passagem em cativeiro "a maior tragédia da história marítima. Este livro importante foca diferentes aspectos do comércio de escravos: a sua base social e económica, por que motivo muitos líderes africanos facilitaram o tráfico de escravos, e como escravos Africano-americanos criaram as suas próprias culturas e mudaram para sempre as Américas. O significado físico, social e emocional de suportar a passagem em cativeiro é explorado, assim como a história e o legado do movimento abolicionista e da luta pela justiça racial.
O livro apresenta um vasto leque de materiais provenientes das colecções do Mariner's Museum e artefactos de todo o mundo reunidos especificamente para esta exposição. Incluem-se gravuras raras, publicadas aqui pela primeira vez, fortalezas de escravos ao longo da costa oeste de África, a arca de bordo de um marinheiro ilustrada com motivos esclavagistas; um selo postal em homenagem padre jesuíta colombiano Pedro Claver, conhecido como o "apóstolo dos pretos" pela sua bondade, e imagens da altura sobre a rebelião a bordo do Amistad.


Sempre me interessei por História (apesar de nem sempre gostar que me dissessem o que estudar e quando estudar). Como em tudo na vida, há partes dela que me interessam mais do que outras. O período negro da História das nações, a que corresponde a duração da escravatura, sempre me atraiu... De uma forma quase mórbida... Da mesma maneira que a maior parte dos condutores abranda ao passar por um acidente na estrada, expectantes de sangue... Sempre me revoltou, confundiu e... Acredito que atraiu é mesmo a palavra certa. Sempre tentei documentar-me o máximo possível sobre o assunto, tentar perceber... Porquê? Porque foi possível? Porque demorou tanto a acabar? Porque é que ninguém se impôs mais cedo? Tantas questões que, nos dias de hoje, ainda envergonham tanta gente que não teve de passar pelas agruras da escravidão nem teve culpa do que se passou.
Este livro é um retrato desse período... Um retrato que nos atinge em cheio na boca do estômago e que nos coloca em frente aos olhos as imagens a que, durante tanto tempo, a Humanidade teimou em fechar os olhos.
Apesar de ser um livro que se centra principalmente na escravatura nas Américas (principalmente América do Norte - USA), as histórias que conta são universais. Não se limitam a espaço geográfico, nação ou credo. É um retrato de todos os escravos, de todos os mercados esclavagistas, de todos os que perderam a voz a caminho de um país que não era o seu, contra a sua vontade.


Nota 4

terça-feira, 16 de março de 2010






A Senhora Rattazzi
Edição Fac-Similada
Camilo Castelo Branco
Calçada das Letras
EAN 9789899572843
ISBN 978-989-95728-4-3


Sou queirosiana! Admito, desde já, essa minha preferência pelo autor d' "A Relíquia" sobre o autor d' "A queda de um anjo". Mas, quem me conhece, já está familiarizado com essa minha característica. Achava o Camilo algo hipócrita (devido ao contraste da sua ideia literária de amor puro e perfeito em relacção à sua vida pessoal), mas, ainda assim, aceitava-o e tolerava-o como um dos grandes nomes da literatura "clássica" portuguesa (infelizmente tão esquecida e tantas vezes vítima de escárnio pela parte dos ditos "intelectuais"). Assim, decidi pegar neste folheto (pois o livro mais não é do que isso) para me tentar redimir por qualquer injustiça praticada por mim em relação a Camilo Castelo Branco. Grande Erro!!! Não só não aumentei a minha estima pela sua escrita como ganhei alguma aversão ao próprio homem! Tenho consciência que o que estou a afirmar é quase blasfemo, mas fiquei com raiva ao Camilo!
A razão pela qual escolhi este livro foi por conhecer, de antemão, a visada da pena literária do mestre de São Miguel de Seide (e sim, antes que me chamem a atenção por uma suposta gaffe literária, sei bem que Camilo nasceu em Lisboa, mas não é essa a terra que associamos ao seu nome). Tendo trabalhado no Palácio Nacional da Pena tive de estudar a história de Portugal do século XIX (período de que data o palácio) e, obviamente, o nome da Princesa Rattazzi surgiu nos meus estudos. Mulher de diplomata, foram variadas as vindas de Maria Rattazzi ao nosso país (a primeira por volta de 1876), tendo-lhe sido abertas as portas dos mais variados salões, mansões, festas e soirées. Dotada de um espírito observador e crítico (onde não faltava, certamente, uma boa dose dessas características tão frequentemente associadas ao sexo feminino - curiosidade e um prazer em opinar sobre tudo e todos), decidiu, em 1879, editar um livro cuja polémica lhe traria a fama nacional: "Portugal de Relance" (Edições Antígona, ISBN 9789726080909). Infelizmente com a fama chegou a polémica. O povo luso não gostou da maneira como a "estrangeira" os descrevia e várias vozes se levantaram para se lhe opor. Camilo fez questão de que a sua voz se ouvisse alto e em bom som.
No entanto, não foi o seu rancor pelas palavras da Sra. Rattazzi que mais me enfureceram... Afinal, todos têm o direito a ter a sua opinião acerca do que lêem. Foi, isso sim, a sua tendência para ofender e para generalizar a todas as mulheres escritoras as falhas que encontrou numa específica autora. A saber:

(sic)
"Mulher escriptora, por via de regra pouco exceptuada, é um homem por dentro. O coração, que devia ser urna de suavissimas lagrimas, faz-se-lhe botija de tinta; e as dôces penas da alma metallisam-se-lhe aguçadas em pennas de aço. O fuso de Lucrecia e da rainha Bertha desfez-se em canetas. Em vez de tecerem o seu bragal, urdem intrigas. (...) e, quando não suspiram, bufam coleras represadas, dizem que têm idéias, que se querem emancipar, muito aziumadas, naturalistas, com um grande ar de pimponas que entraram no segredo dos processos; e, se não batem nos homens não é porque elles não o mereçam. (...) O Dom Francisco Manoel de Mello tinha razão; Mulheres doutoras, authoras e compositoras dava-as ao diabo. (...) Não ha feminilidades que se respeitem desde que a mulher se masculinisa, e, como escriptora de virago, salta as fronteiras do decoro, sofraldando as espumas das rendas até à altura da liga azul-ferrête."
É este tipo de incoerência que me aborrece em Camilo. Da mesma maneira que a sua visão romântica de amor puro nada tinha a ver com a sua vida pessoal, também esta sua opinião sobre o lugar da mulher da litaratura só pode ser ou uma ironia (de péssimo gosto) ou a falta de discernimento total por parte de um homem que foi preso pelo seu amor por uma mulher casada, Ana Plácido, ela própria... uma escritora.
 
Nota 3

quinta-feira, 11 de março de 2010




Alice no País das Maravilhas
(Audiolivro)
de Lewis Carroll
Editor: 101 Noites - Criação de Produtos Culturais
Colecção: Livros Para Ouvir
ISBN: 9789728494780



Sinopse

Alice no País das Maravilhas de Lewis Carroll lido por Mafalda Lopes da Costa integra a colecção "Livros para Ouvir" que alia o prazer de ler ao prazer de ouvir. Esta edição reúne dois CD's com uma versão adaptada para audiolivro e um guia de A a Z, essencial para quem quer saber mais sobre o imaginário fantástico de Lewis Carroll. Descubra as histórias por detrás das principais personagens e os muitos artistas que se inspiraram no clássico que atravessou gerações. Com as ilustrações originais criadas por John Tenniel para a primeira edição de 1865, esta edição fará as delícias de todos os admiradores deste universo absurdo e delirante.


A antiga directora da revista LER e actual repórter da TSF, Mafalda Lopes da Costa dá voz a uma das histórias infantis mais emblemáticas de sempre. Numa altura em que Alice no País das Maravilhas chega às salas de cinema, pessoas de várias gerações redescobrem a história da protagonista e dos personagens fantásticos que vai encontrando nas suas aventuras nesse País das Maravilhas. Esta versão da Livros Para Ouvir é uma alternativa para quem quer conhecer ou relembrar este belíssimo livro, mas que não tem tempo para se dedicar à leitura. Recoste-se no sofá, ou no banco do carro, e deixe Mafalda Lopes da Costa levá-lo de volta à infância.


terça-feira, 9 de março de 2010

Stieg Larsson?



Huuuummmm.... A nova capa do livro de Tiago Rebelo (bem como o título) fazem-me lembrar qualquer coisa... Não sei bem o quê....

sexta-feira, 5 de março de 2010

Dedicatórias...




Once Again To Zelda
(The Stories Behind Literature's Most Intriguing Dedications)
Marlene Wagman-Geller
Perigee Trade Books
ISBN 978-0-399-53462-1
EAN 9780399534621



Muitas das vezes, ao pegarmos num livro para ler, passamos apressadamente a página em que o autor dedica o fruto do seu trabalho a alguém que, por norma, com ele partilhou o percurso de criação. Ao fazê-lo não estamos, no entanto, a desvalorizar essa relação, descrita em meia dúzia de palavras... Pura e simplesmente sabemos que o livro não nos é dedicado e não precisamos de parar e ler a confirmação dessa certeza. Quando, no entanto, a curiosidade nos leva a querer conhecer a quem o autor se sente obrigado a reconhecer a ajuda ficamos, na maior parte das vezes, conscientes da ignorância do porquê desse reconhecimento.

Este livro vem decifrar o enigma das dedicatórias de alguns dos maiores livros da história literária dos últimos tempos. Ao longo de 50 dedicatórias/livros, vamos conhecendo as pessoas, e não só, que mereceram o reconhecimento público de alguns dos maiores vultos literários de sempre.

Para além da explicação propriamente dita, temos um vislumbre da vida do autor. Isto é, ao relatar a vida do escritor em questão, a autora explica, dentro desse contexto, o porquê da dedicatória. Na lista dos livros visados contamos com:

- Frankenstein, de Mary Shelley
- Jane Eyre, de Charlotte Brontë
- Alice no País das Maravilhas, de Lewis Caroll
- De Profundis, de Oscar Wilde
- O Grande Gatsby, de F. Scott Fitzgerald (dedicatória que deu título ao presente livro)
- Orlando, de Virginia Woolf
- Por Quem os Sinos Dobram, de Ernest Hemingway
- Lolita, de Vladimir Nabokov
- Dr. Jivago, de Boris Pasternak
- A Sangue Frio, de Truman Capote
- Amor em Tempos de Cólera, de Gabriel Garcia Márquez
- O Código Da Vinci, de Dan Brown
- Suite Francesa, de Irène Némirovsky
- e muitos, muitos outros


Para mim, que sempre considerei o conhecimento sobre a vida pessoal de um escritor como uma mais valia para tirar o maior prazer possível da sua escrita, este livro revelou-se uma aposta ganha. Os pequenos vislumbres que temos para a vida de Dostoievsky, George Eliot, Mark Twain, Carson McCullers, Eugene O'Neill, Harper Lee, Sylvia Plath, Arthur Miller, Stephen King, Philip Roth, Salman Rushdie, J. K. Rowling, Nicole Krauss, Ken Follett, etc etc etc, são como que pequenas janelas que se abrem à nossa frente e nos apresentam a oportunidade de conhecer melhor autores que nos proporcionaram grandes momentos de prazer, ou podem ser, também, um convite a novos (e duradouros) conhecimentos.

Recomendo!!!


Nota 4

terça-feira, 2 de março de 2010

Shakespeare



The Taming of the Shrew
William Shakespeare


Edição portuguesa:
O Amansar da Fera
Campo das Letras
ISBN: 9789726106739


Sinopse:

Nesta peça, uma das primeiras comédias de Shakespeare, se revela já o talento do escritor e o sentido de oportunidade do dramaturgo nesse contexto histórico e cultural verdadeiramente singular que é o do teatro comercial e popular isabelino. A sugestão italiana, ostensiva nos ambientes e figuras representados ou em convenções estéticas e processos de composição, alia-se harmoniosamente à vivacidade da farsa, à fecundidade da tradição popular e aos gestos livres da herança dramática medieval. De resto, por detrás da cidade italiana do Renascimento, de patrícios respeitáveis ou gananciosos burgueses em arrojada competição, de criados ardilosos, recuperados da comédia greco-latina, e de mulheres destinadas ao mercantilismo das alianças matrimoniais, ferve a pujante Londres urbana e capitalista da última década do século XVI.Mas afinal a referência temática que estrutura a acção é a do estatuto da mulher no sistema social e moral do patriarcado. Cristóvão Finório, o latoeiro e vagabundo, rei por um dia, é presenteado com uma representação em que Catarina, a fera insubmissa, é amansada pela astúcia e persistência de Petrúquio, o domador que triunfalmente a irá reconduzir à ortodoxia da mulher obediente e exemplar. Uma airosa celebração do poder transfigurador da palavra e das virtudes do teatro? Uma perigosa incursão nos limites do cómico e nas fantasias do poder masculino?



Esta peça, uma das mais divertidas, se não mesmo a mais divertida do bardo inglês, é extremamente sexista. Nos dias de hoje, para nos divertirmos e rirmos com ela precisamos de ter sempre presente que a realidade em que ela foi escrita é complectamente díspar da que hoje vivemos... Se assim não for e. principalmente, se o leitor for uma mulher, o sangue irá ferver!!!!

A peça conta as aventuras românticas de duas irmãs; Bianca e Katherine. A primeira, mais nova, é doce, romântica e bela e, tendo a seus pés 3 pretendentes (Lucentio, Gremio e Hortensio) deseja, mais do que tudo, casar-se e "viver feliz para sempre". No entanto há um entrave à felicidade da jovem. O seu pai, Baptista, não pretende perder a sua filha dócil e sensata e, para adiar ao máximo essa inevitabilidade coloca uma condição: Bianca, sendo a mais nova das duas irmãs, só poderá casar depois de a mais velha, Katherine, o ter feito. O problema é que Katherine, a Fera do título, é o oposto da irmã; de ideias próprias e teimosa não consente que lhe tentem ordenar o que fazer, e, com fraca opinião sobre o sexo oposto, não pretende entrar na prisão pessoal de um casamento. Gremio e Hortensio, desejosos da mão de Bianca, decidem procurar e encontrar, eles próprios, um esposo para Katherine. Essa figura surge na pessoa de Petruchio, um nobre sem dinheiro, de Verona, que se deixa seduzir pela ideia do casamento com a fera (ou, mais precisamente, com o dote que irá ganhar do pai dela). Assim sendo, e contra a vontade da jovem (cujo dever, segundo a época, era o de obedecer ao pai), os dois casam-se e vão viver para a propriedade do noivo. No meio da imundice que é a casa de Petruchio, e na companhia dos seus criados (tão, ou mais, sujos e ignorantes que o patrão), Katherine tenta, em vão, fazer prevalecer a sua vontade e viver com a autoridade que aplicava sobre o seu velho pai. Mas Petruchio não a teme como Baptista e através de lições, muitas vezes propositadamente cruéis, começa a "amansar a fera". Na cena final da peça, estando todas as personagens à mesa (incluindo Bianca finalmente casada com o seu amado Lucentio, e Hortensio casado com uma viúva rica . cuja personalidade faz lembrar a de Katherine), Petruchio prova a todos que, no final, a sua esposa é a mais dócil e obediente das mulheres.



Nota 4

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Considerações literárias

"Tenho ternura, ternura até às lágrimas, pelos meus livros de outros em que ecrituro, pelo tinteiro velho de que me sirvo, pelas costas dobradas do Sérgio, que faz guias de remessa um pouco para além de mim. Tenho amor a isto, talvez porque não tenha mais nada que amar - ou talvez, também, porque nada valha o amor de uma alma, e, se temos por sentimento que o dar, tanto vale dá-lo ao pequeno aspecto do meu tinteiro como à grande indiferença das estrelas."

Fernando Pessoa, in Livro do Desassosego

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Descobrindo José Emilio Pacheco




As Batalhas no Deserto
José Emilio Pacheco
Oficina do Livro (colecção Ovelha Negra)
EAN: 9789895551774
ISBN: 989-555-177-0


Sinopse:

Uma história de amor impossível que vendeu mais de meio milhão de exemplares só no México.
Esta é a história de amor impossível, narrada numa obra que ainda guarda espaço para abordar temas como a corrupção social e política, a modernização do México ou o desaparecimento do país tradicional. Ao mesmo tempo que vai resgatando memórias de uma cidade que ama intensamente - mas que aqui recria sem nostalgia e denuncia de uma forma implacável -, através do amor de Carlitos, o autor aprofunda a cumplicidade com os leitores, numa linguagem simples, depurada, comovente e aberta a várias leituras e interpretações. Traduzida em inúmeras línguas, só no México As batalhas no Deserto vendeu mais de meio milhão de exemplares.

"Mais do que uma comovente história de amor impossível, um texto singular, que já faz parte da história da literatura latino-americana."
Antonio Sarabia, in Prefácio


Apesar de ter estudado Línguas e Literaturas Modernas na Universidade e de trabalhar numa livraria tenho de admitir que, até à chegada deste livro à loja, nunca tinha ouvido falar neste autor. Ao arrumar os livros, no entanto, tive a oportunidade de ler a sinopse da obra, que me agradou, o que me levou a querer saber mais sobre José Emilio Pacheco. Descobri então que, tendo nascido em 1939, é hoje considerado um dos poetas mais consagrados do méxico e que, para além do presente livro, escreveu mais quatro romances e/ou conjunto de contos.

Acabei por comprar o livro... E li-o rapidamente... Apesar de sentir dificuldade em compreender e fazer a ligação com algumas das passagens que fazem referência não só à realidade mexicana como também às referências infantis/juvenis dos anos 5o. Sinto que, provavelmente, o meu pai irá rever-se e perceber melhor a realidade retratada no livro do que eu alguma vez poderei. Ainda assim, gostei do livro e senti-me imersa numa maré de nostalgia e de memórias de uma inocência perdida que se sente na voz do personagem principal, Carlitos.

A história é simples e despretenciosa, como deve ser toda a infância. Carlitos, já adulto, relembra a sua infância e juventude no seio de uma família de classe média no México. Tendo perdido dinheiro com o avanço do progresso (o pai, dono de uma fábrica de sabão, vê o negócio ir por água a baixo com a chegada dos detergentes em pó) a situação familiar deteoria-se e cada um procura conforto nas únicas coisas que lhe dão prazer... O pai dedica-se a aprender o Inglês (o idioma do futuro), a mãe entrega-se à fé e o irmão ao sexo e ao crime. Carlitos, esse encontra refúgio na sua primeira paixão. O que nada teria de estranho, não fora o objecto do seu amor juvenil a mãe do seu melhor amigo (e amante de uma das figuras mais proeminentes do governo vigente da altura). As repercurssões do seu inocente acto vão marcá-lo até à idade adulta.

Gostei do livro e de ter tido a oportunidade de conhecer um novo autor.


Nota 3


Dois poemas de José Emilio Pacheco:

Indeseable

No me deja pasar el guardia.
He traspasado el límite de edad.
Provengo de un país que ya no existe.
Mis papeles no están en orden.
Me falta un sello.
Necesito otra firma.
No hablo el idioma.
No tengo cuenta en el banco.
Reprobé el examen de admisión.
Cancelaron mi puesto en la gran fábrica.
Me desemplearon hoy y para siempre.
Carezco por completo de influencias.
Llevo aquí en este mundo largo tiempo.
Y nuestros amos dicen que ya es hora
de callarme y hundirme en la basura.



Memoria

No tomes muy en serio
lo que te dice la memoria.
A lo mejor no hubo esa tarde.
Quizá todo fue autoengaño.
La gran pasión
sólo existió en tu deseo.
Quién te dice que no te está contando ficciones
para alargar la prórroga del fin
y sugerir que todo esto
tuvo al menos algún sentido.



Tradução (à minha responsabilidade)

Indesejável

O guarda não me deixa passar.
Ultrapassei o limite de idade.
Venho de um país que não existe mais.
Os meus papéis não estão em ordem.
Falta-me um carimbo.
Preciso de uma outra empresa.
Não falo a língua.
Não tenho conta no banco.
Não passei no exame.
Eles acabaram com o meu posto na grande fábrica.
Estou desempregado, agora e para sempre.
Não tenho cunhas.
Estive muito tempo aqui neste mundo.
E os nossos chefes dizem que é hora
de cale-me e afundar-me no lixo.



Memória

Não leves muito a sério
o que a memória te diz.
Talvez não tenha existido aquela tarde.
Talvez tudo fosse ilusão.
A enorme paixão
só existiu no teu desejo.
Quem disse que não estás a contar histórias
para aumentar o sentido de ordem
e sugerir que tudo isto
teve ao menos algum sentido.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

História de uma gaivota e do gato que a ensinou a voar




História de uma gaivota e do gato que a ensinou a voar
Luis Sepúlveda
Porto Editora
ISBN 978-972-0-04092-3
EAN 9789720040923



Sinopse

Esta é a história de Zorbas, uma gato grande, preto e gordo. Um dia, uma formosa gaivota apanhada por uma maré negra de petróleo deixa ao cuidado dele, momentos antes de morrer, o ovo que acabara de pôr.Zorbas, que é um gato de palavra, cumprirá as duas promessas que nesse momento dramático lhe é obrigado a fazer: não só criará a pequena gaivota, como também a ensinará a voar. Tudo isto com a ajuda dos seus amigos Secretário, Sabetudo, Barlavento e Colonello, dado que, como se verá, a tarefa não é fácil, sobretudo para um bando de gatos mais habituados a fazer frente à vida dura de um porto como o de Hamburgo do que a fazer de pais de uma cria de gaivota...Com a graça de uma fábula e a força de uma parábola, Luis Sepúlveda oferece-nos neste seu livro já clássico uma mensagem de esperança de altíssimo valor literário e poético.



Por trabalhar numa livraria já perdi a conta às vezes em que me abordaram para pedir este livro... Por norma adolescentes (muitas das vezes envergonhados) ou os seus pais (sem paciência para andar às voltas na loja à procura do livro que o professor mandou os filhos lerem). Sim, é um dos temidos "livros do plano nacional de leitura". Devo admitir que, até à data, nunca me sentira particularmente tentada a debruçar-me na sua leitura. Mas... Foi então que recebemos uma nova edição! Mais cara, é verdade, mas também mais apetecível, muito graças às ilustrações de Sabine Wilharm. Li, então, a sinopse no verso da capa e decidi-me... Ia mergulhar no mundo do gato Zorbas e acompanhá-lo na aventura de ensinar uma gaivotinha a voar.

Zorbas, o gato mencionado no título, é, como a sua descrição nos relembra frequentemente durante a história, é "um gato grande, preto e gordo" que, tendo tido a sorte de ser salvo por um garoto quando mais não era que um filhote, vive uma vida tranquila e priveligiada numa casa no porto de Hamburgo. Um dia é surpreendido pela aterragem forçada de uma gaivota na varanda onde passa as tardes. A gaivota, tendo sido apanhada por uma maré de petróleo, usara as últimas forças para ali chegar. Consciente que o seu fim está próximo pede auxílio a Zorbas: vai usar o seu último fôlego para por um ovo, mas para isso precisa da ajuda do gato. As três promessas que lhe pede para cumprir sâo: 1º não comer o ovo, 2º cuidar e proteger o ovo até ao nascimento da sua filha e 3º ensinar a cria a voar. Comovido com a situação da gaivota Zorbas aceita cumprir os três pedidos antes de abandonar a gaivota para ir à procura de quem o possa ajudar a salvá-la da morte eminente. Mas, ao regressar com os seus três companheiros (que com ele fazem lembrar a relação de D'Artagnan e os Três Mosqueteiros de Dumas, com o seu mote de "Um por Todos e Todos por Um), os gatos Secretário, Colonello e Sabetudo (aos quais, mais tarde, se irá juntar Barlavento, um gato do mar) encontra o corpo da gaivota sem vida e um belo ovo branco com pintas azuis perto do corpo. A partir desse momento Zorbas e os seus companheiros, que se recusam a abandoná-lo pois a promessa de um gato do porto compromete todos os gatos do porto, têm entre mãos uma tarefa que, mais que estranha, é-lhes assustadora pois não só não sabem nada de pássaros como não fazem ideia de como se voa. A única ferramenta de que dispõem é da amada enciclopédia de Sabetudo. Mas será possível aprender a voar a partir de livros? E se não, como pode um gato ensinar a voar uma pequena gaivota? Será esse o motivo que os levará a quebrar, excepcionalmente, o tabu?

Li esta pequena fábula, pois é disso que se trata - uma fábula dos tempos modernos - num fôlego e redescobri a doçura e as lições contidas nos simples contos. A moral é simples e presente durante todo o relato (a relação e inter-ajuda entre "pessoas" diferentes que, sem olhar às diferenças, se apoiam na luta constante para a obtenção de sonhos particulares e/ou comuns), mas nada a sumariza melhor que a frase proferida por Zorbas na penúltima página: "só voa quem se atreve a fazê-lo!"
 
Nota 4

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

Considerações literárias

"Um livro é um grande cemitério onde, sobre a maioria dos túmulos, não se podem mais ler os nomes apagados."

Marcel Proust
(O Tempo Reencontrado)

domingo, 7 de fevereiro de 2010

A morte melancólica do rapaz ostra





The Melancholy Death of Oyster Boy & other stories
Tim Burton
Faber & Faber
ISBN 9780571224449



Se conhece a mente por trás de filmes como "Sweeney Todd", "A noiva Cadáver", "O Estranho Mundo de Jack" ou "Eduardo Mãos de Tesoura", já sabe que Tim Burton não é uma pessoa convencional... Logo, este livro também o não é... Mas é, isso sim, um retrato fidedigno da mente do homem que o escreveu. Nele se apresentam heróis tão diferentes como o Oyster Boy que dá o título ao livro e, ainda: Staring Girl, Brie Boy, The Pin Cushion Queen, Char Boy, Voodoo Girl e muitos outros. Os textos têm a ironia e o humor negro a que o cineasta já habituou os seus fãs e estão ilustrados com desenhos que complementam, na perfeição, os poemas e a já citada ironia.

Pode, ainda, encontrar o livro numa belíssima tradução da Antígona (ISBN 9789726081845)... Mas, se tem facilidade com a língua inglesa, nada melhor que ler o original e ficar a conhecer estas personagens pela voz de Tim Burton!



Roy, the Toxic Boy

To those who knew him
-his friends-
we called him Roy.
To others he was known
as that horrible Toxic Boy.

He loved ammonia and asbestos,
and lots of cigarette smoke.
What he breathed in for air
would make other people choke!

His very favorite toy
was a can of aerosol spray;
he'd sit quietly and shake it,
and spray it all the day.

He'd stand inside the garage
in the early-morning frost,
waiting for the car to start
and fill him with exhaust.

The one and only time
I ever saw Toxic Boy cry
was when some sodium chloride
got into his eye.

One day for fresh air
they put him in the garden.
His face went deathly pale
and his body began to harden.

The final gasp of his short life
was sickly with despair.
Whoever thought that you could die
from breathing outdoor air?

As Roy's soul left his body
we all said a silent prayer.
It drifted up to heaven
and left a hole in the ozone layer.

Nota 4

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

D. Juan ou Estratega?




Os Amores de Salazar
Felícia Cabrita
A Esfera dos Livros
EAN: 9789896260347
ISBN: 989-626-034-6




Sinopse
Uma vida ao serviço da nação. Foi assim que António de Oliveira Salazar quis ficar conhecido para a História. Um homem sério, ex-seminarista, casto, antiquado, pouco dado a devaneios amorosos. Tudo a bem da nação. Mas a paixão bateu bem cedo à porta deste homem. Conhecido por trocatintas, Salazar tocou no coração de várias mulheres, deixandoas, sem esperança, a suspirar de amor. Felismina de Oliveira, o seu primeiro amor. Júlia Perestrelo, a jovem a quem dava explicações. Maria Laura, o amor pecaminoso. Maria Emília, a bailarina e astróloga que o ajudava a tomar decisões consoante os astros. Maria, a Governanta de Portugal, e as suas sobrinhas, que rapidamente ganham um lugar no seu coração e ficam conhecidas como as pupilas de Salazar. Mercedes Feijó, a amante do Hotel Borges; ou Christine Garnier, a jornalista que o levou, num acto pouco usual, a abrir os cordões à bolsa para enviar garrafas do melhor vinho para França. Apesar dos rumores e mesmo de algumas notícias de jornal, António de Oliveira Salazar nunca casou. Preferiu levar uma vida de D. Juan. Um destruidor de corações que nunca conseguiu fazer nenhuma mulher feliz.




Este livro é o resultado de uma pesquisa elaborada pela jornalista Felícia Cabrita acerca do lado secreto da vida de um homem que conduziu (e restringiu) uma nação durante anos. Um lado mais humano que, por norma, não associamos ao chefe de estado que foi Salazar. E, no meu ponto de vista, o objectivo (senão da autora pelo menos dos que com Salazar colaboraram e que conheceram o Homem na sua intimidade, e em cujos depoimentos este livro foi assente) era mesmo esse, humanizar um homem que, durantye anos, pareceu carecer do factor humano...

O livro é composto por 10 capítulos, sendo 9 deles baptizados com o nome de cada uma das várias "conquistas" de Salazar... O uso de aspas na palavra conquistas é propositado! É Óbvio que não sou expert na matéria e que tenho muito menos qualificações que a autora para opinar publicamente sobre a vida de um homem sobre a qual apenas me debrucei muito ligeiramente ao longo do meu percurso de estudante e leitora, mas... Na verdade não consigo acreditar, nem aceitar, a ideia de Salazar como um precursor de sedutores na linha do Zezé Camarinha (sem o "put the cream"). Na verdade acho que mais que sedutor, ou seduzido, Salazar foi um estratega na sua vida privada, assim como o foi na pública. Acredito que algumas mulheres tenham gravitado à sua volta (como sempre acontece com homem no poder), mas não acredito que ele tenha correspondido às expectativas femininas. Aceito, isso sim, que Salazar tenha visto o potencial em manter cada uma delas perto de si e tenha alimentado os desvaneios apaixonados de mulheres que acreditavam conseguir levar o Presidente ao altar. Em vez de amantes tornaram-se conselheiras, informadoras, espias, o seu bilhete premiado para ascender às mais altas esferas sociais, a sua possibilidade de limpar a imagem na comunicação social, etc etc etc

Mesmo a autora escreve, na página 137, aquando do capítulo sobre Carolina Asseca, "o Troca-tintas, como de costume, não a quer mas não a afasta.

Depois de acabar a leitura desta obra continuo com a mesma ideia que tinha de Salazar... E essa ideia não corresponde a um D. Juan.

No entanto, tenho de o referir, achei que a obra era uma boa janela para a vida de um homem do qual, ainda hoje, se tem tanto pejo de falar (do homem, não do político).



Nota 3

sábado, 23 de janeiro de 2010

Considerações literárias

Os leitores extraem dos livros, consoante o seu carácter, a exemplo da abelha ou da aranha que, do suco das flores retiram, uma o mel, a outra o veneno.

Nietzsche

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Quem Quer Ser Bilionário?




Quem Quer Ser Bilionário?
Vikas Swarup
Edições Asa
EAN 9789724148731
ISBN 978-972-41-4873-1


Sinopse:

Porque está Ram, um pobre empregado de mesa de Mumbai, na prisão?
A) - Esmurrou um cliente
B) - Bebeu demasiado whisky
C) - Roubou dinheiro da caixa
D) - É o vencedor do maior prémio de sempre de um concurso de televisão

A resposta certa é a alínea d).

Ram foi preso por responder correctamente às doze perguntas do concurso televisivo Quem Quer Ser Bilionário?.
Porque um pobre órfão que nunca leu um jornal ou foi à escola não pode saber qual é o mais pequeno planeta do sistema solar ou o título das peças de Shakespeare. A não ser que tenha feito batota. Mas a verdade é que foi a própria vida a fornecer-lhe as respostas certas às doze perguntas cruciais. Desde o dia em que foi descoberto num caixote do lixo que Ram revela instintos de sobrevivência infalíveis e aparatosamente criativos. Espantando uma audiência de milhões, serve-se dos seus conhecimentos de rua para arranjar respostas não só para o concurso televisivo mas também para a própria vida.
Na história do jovem Ram concentra-se toda a comédia, a tragédia, a alegria e a amargura da Índoa moderna.



Se foi um dos milhões que, em todo o mundo, viu o filme sensação dos óscares do ano passado e julga encontrar neste livro um relato fidedigno desse filme... Desengane-se!

A essência da história é, basicamente, a mesma, mas o foco da mesma e das personagens está distante da adaptação cinematográfica. Nesta obra o lado romântico da história, o qual estava no centro do filme, quase não é tocado, com Nita, o objecto dos afectos de Ram, a aparecer apenas no penúltimo capítulo... O jovem, ao contrário do que se passa no filme, não tem irmãos tendo, isso sim, um amigo chamado Salim (que não é nada como foi representado no filme - i.e., é uma boa pessoa)... O motivo que o leva a concorrer ao programa não é o mesmo que na adaptação... No entanto, a essência da obra é a mesma da sua versão da sétima arte. Através das histórias da sua vida pessoal vamos chegando, mesmo sem o sabermos, às respostas às questões que lhe vão sendo colocadas.

O livro é, não só, uma história pessoal da ascensão de alguém numa sociedade de classes bem definidas, como também a história de um país e de um povo. Tal como no Tigre Branco este livro mostra-nos um lado da Índia cru, feio, agreste e podre... Mas nem por isso qualquer um dos dois livros deixa de ser excelente!!!



Nota 4

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

A Dama das Camélias





A Dama das Camélias
Alexandre Dumas, Filho



Se viu o filme Moulin Rouge e gostou, então é provável que goste deste livro!

Li-o quando ainda era miúda (tinha p'raí 13 anos) e acredito que o que me chamou a atenção foi a referência, no título, às Camélias (flor importante em Sintra, onde moro), já para não falar que aliava esse factor ao descobrimento de um dos nomes clássicos da literatura (campo que começava a explorar).

A história deste livro é um dramalhão comparável com os contemporâneos livros de Nicholas Sparks (pelo que poderá querer ter um stock de Kleenex à mão).

O enredo da obra centra-se na relação entre a cortesã Marguerite (a Dama das Camélias - nome por que é conhecida devido à sua predilecção por esta flor) e o jovem Armand. Antes de conhecer o jovem, Marguerite é uma das mais pretigiadas cortesãs de Paris (se não mesmo a mais pretigiada) e mantém relações com condes e duques. Ao conhecer o jovem estudante de Direito, Marguerite perde-se de amores por ele, sendo correspondida nesse sentimento. Mesmo sabendo que Armand não lhe poderá proporcionar o estilo de vida a que está habituada, a Dama das Camélias renuncia ao seu estilo de vida para poder viver a sua história de amor. Mas, ao verem-se na penúria e sem o apoio de quem quer que seja, as coisas começam a deteriorar-se entre o casal. Tudo piora quando o pai de Armand, às escondidas do próprio filho, aborda Marguerite e lhe pede que deixe o seu filho para o bem deste (que nunca poderá almejar a ser alguém na sociedade se persistir nesta relação) e da jovem irmã de Armand (que ficará prejudicada socialmente pela desonra do irmão). Marguerite, por amor, aceita. (adoro estes livros em que o vilão, por motivos honrosos, força a desgraça dos demais e em que a jovem, pela grandeza do seu espírito, se sacrifica - não podia ser mais lamechas, mas enfim...)
Armand, julgando-se desprezado por aquela que ama, entra numa depressão... Quando finalmente a volta a encontrar, Marguerite está na companhia de uma outra cortesã e tem novo amante. Despeitado, Armand tenta seduzir a parceira de Marguerite. Esta vai ter com ele para lhe pedir que não seduza outras mulheres à sua frente e os dois acabam por fazer amor. Depois, arrependida por ter faltado à palavra que dera ao pai do homem que ama, abandona-o uma vez mais. Mais magoado que nunca, Armand vinga-se sem dó nem piedade: Num baile aproxima-se da Dama das Camélias e, à frente de todos os convivas, entrega-lhe um envelope cheio de dinheiro "pelos serviços prestados". O que o jovem não sabia era que a cortesã está a morrer, tuberculosa. Mortificada pela acção de Armand e vendo a natureza da sua profissão publicamente revelada, Marguerite, sendo abandonada pelos antigos amantes, morre só e na penúria. Armand saberá, depois da sua morte, através do seu diário, os motivos do seu afastamento e a dor que ele lhe causou pelas suas acções.



Nota 4

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Considerações literárias

Everyone who knows how to read has it in their power to magnify themselves, to multiply the ways in which they exist, to make their life full, significant, and interesting.
- Aldous Huxley

Águas Negras



Águas Negras
Joyce Carol Oates
Edições Asa
Colecção Pequenos Prazeres
EAN 9789724112756
ISBN 972-41-1275-6


Sinopse:

Na noite da festa do 4 de Julho, um carro conduzido por um Senador, no qual viajava também uma jovem que ele conhecera horas antes, despista-se ao fazer uma curva inesperada junto de uma ponte e mergulha nas águas negras de um pequeno rio.A partir desse instante, o ponto de vista adoptado é o da própria jovem, Kelly Kelleber.E o leitor vai descobrindo, pouco a pouco, o seu passado e o seu presente, o seu espírito e o seu corpo, através de páginas que descrevem de forma admirável a figura dessa jovem atraída por um homem mais velho, no qual crê vislumbrar um herói, um pai e um possível amante. A sua voz adquire então o tom da tragédia clássica, já que ela parece falar em nome de todas as mulheres que sucumbem à sedução que emana de certos homens, arrastadas por sonhos românticos que a realidade se encarrega de brutalmente desmentir.



Na verdade pouco mais há a acrescentar à sinopse deste pequeno livro (128 páginas), o qual se supõe ter sido inspirado pelo romance de Marilyn Monroe com os dois senadores Kennedy.
Durante a leitura vamos acompanhando a morte iminente da jovem Kelly Kelleher (e não Kelleber, como se pode ler na sinopse disponível no site da Asa) pela prespectiva da jovem.

Através da voz da víctima vamos sabendo como esta, que se encontrava na festa do 4 de Julho em casa de uma amiga, Buffy, com quem planeava ficar uma temporada, acaba por, ao ser apresentada a um senador dos Estados Unidos da América, por quem tem grande admiração (ao ponto de ter feito a sua tese sobre ele), decidir abandonar a festa com o homem que a fascina. A hipótese de passar de admiradora a amante deste grande homem da política nacional é. simplesmente, algo que ela não consegue recusar.

Ele sente.se sexualmente atraído por ela, quanto a isso não há dúvidas, tendo dado-lhe mais atenção do que a qualquer outra pessoa na festa antes de lhe propor que o acompanhasse a um motel. Quanto a ela, mais do que a atracção sexual (uma vez que não é uma pessoa para quem o sexo tenha grande valor para além do de dar prazer à pessoa que ama) o que a atrai é o Homem!

No entanto, o Senador (do qual nunca sabemos o verdadeiro nome), não lhe dá o valor que dela recebe. Tendo bebido mais do que a conta durante a festa (e continuando a fazê-lo durante a viagem) acaba por perder o controlo do carro fazendo com que este se despiste e caia nas águas negras de um rio. Preocupado apenas consigo e com a sua carreira, e como este episódio poderia ser utilizado pelos seus rivais políticos contra si, despacha-se a abandonar a viatura afundada, mesmo quando isso significa não só abandonar a jovem como, até, utilizá-la como impulsionadora para ganhar o balanço necessário para o mergulho que o levará à superfície e ao oxigénio.

Kelly, que mais do que tudo acredita no Homem e no Político, aguarda pacientemente que este regresse para a libertar enquanto tenta aproveitar a bolha decrescente de ar no carro afundado. Enquanto o faz vai recordando o seu passado, familiar, sentimental e profissional... Sem nunca perder a esperança ou de acreditar na sua salvação. No entanto, com o tempo e a falta, cada vez mais acentuada, de oxigénio, as suas lembranças vão-se misturando com alucinações em que ela não é ela, em que toma o lugar de outras pessoas (como o de uma amiga estudantil que se tentou matar) ou em que, pura e simplesmente, se vê a ser salva e a regressar aos braços dos pais como se de uma criança se tratasse.

Sem o saber, o Senador abandonara-a sem qualquer intenção de voltar, e estava mais preocupado em ligar para o seu advogado para o ajudar a limpar-se do que passara do que propiamente em chamar ajuda para a tirar das águas infestas.

"...e a água negra encheu os seus pulmões e ela morreu."


Nota 3